Eliane Brum e as crianças de Altamira

A foto está sem crédito no El País, o que me leva a crer que é uma imagem captada pela própria Eliane Brum
"A violência não é estranha à menina. Menos de dois anos atrás, seu pai foi executado pela polícia em um dos chamados “Reassentamentos Urbanos Coletivos”(RUCs), os bairros distantes do centro da cidade construídos pela Norte Energia SA, a empresa que materializou a Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu. Foi nestas casas feitas para não durar que a empresa jogou as centenas de famílias expulsas pela usina."

"As crianças cujos pais e avós foram expulsos da floresta, foram roubadas de tudo. Quando o menino não sabe o que é a Amazônia e acredita que seu país é o seu bairro, o que ele mostra é a radicalidade da experiência de desterritorialização. Ele está perdido, da forma mais profunda que alguém pode estar perdido. Sem norte, mas também sem sul, leste e oeste. São crianças sem passado nem futuro, cujo presente é violência."

Esses são trecho do artigo de Eliane Brum publicado em 15 de agosto deste ano na versão brasileira do El País. Um primor de texto (mais um) que mostra o que deve ser o jornalismo. Além das histórias de vida contada em detalhes impressionantes, há também a conexão de histórias e fatos sem ligação óbvios que passam despercebidos no noticiário factual comercial.

Quem lê As Crianças de Altamira tem uma visão muito mais complexa do quadro construído dia a dia, ano a ano, que é apresentado a conta gotas em forma de desgraças individuais e (aparentemente) desconexas. A forma de ver e contar a história do massacre de Altamira é um exemplo de jornalismo a ser seguido e compartilhado, sobretudo em tempos de pautas escolhidas por algoritmos.

Publico aqui essa reflexão muito mais como recado para mim mesmo. Um lembrete de que é possível fazer bom jornalismo mesmo quando o tema parece ultra violento e factual.

Comentários